Ressurreição III

Jo 20, 11-29

A Igreja divina, a Igreja humana e a humanidade pecadora se interagem.

Este Evangelho refere-se às aparições de Jesus aos discípulos, depois de Sua morte na cruz. Contudo, vamos retroceder ao v. 11 para entendermos melhor como se deu o diálogo de Jesus com a humanidade pecadora, personificada por Maria Madalena.

"Maria estava junto ao sepulcro, de fora, chorando. Enquanto chorava, inclinou-se para o sepulcro e viu dois anjos, vestidos de branco, sentados no lugar onde o corpo de Jesus fora colocado, um à cabeceira e outro aos pés."

Maria ficou à porta do túmulo, isto é, não entrou na intimidade da morte de Jesus, ficou de fora chorando e viu, embora sem entender, dentro do túmulo aquilo que era divino (o Anjo à cabeceira) e humano (o Anjo aos pés), a representação de Jesus em Sua dupla natureza: a divina e a humana. Nesta dupla natureza estão também as duas Igrejas. E elas fazem a primeira pergunta a Maria: "Mulher, por que choras?" É como dissessem: Ó humanidade pecadora, por que choras? Olhas a minha humanidade, mas vês minha divindade. Como não entendera, ela respondeu: "Levaram o meu Senhor, e não sei onde o colocaram." Externa aqui a sensação de dor pela perda do divino e sua busca ansiosa. Vemos ainda que a humanidade pecadora existe enquanto diante do divino, pois este é que lhe dá referência, que lhe serve de paradigma. Ela chora por sentir-se órfã, perdida. Não disse que Jesus estava morto, mas que "levaram o meu Senhor", levaram o divino.

"Dizendo isto, voltou-se e viu Jesus em pé, mas não o reconheceu." Quer dizer, a humanidade pecadora, retroagindo no tempo, viu mas não reconheceu ali Jesus em sua divindade. E Jesus repete a pergunta dos dois Anjos: "Mulher, por que choras?" E faz uma segunda pergunta: "Quem procuras?" Este é um diálogo claro de Jesus com a humanidade pecadora.

"Pensando ser ele o jardineiro, ela lhe diz: 'Senhor, se foste tu que o levaste, dize-me onde o puseste e eu o irei buscar.'" Esta é uma das coisas mais importantes deste Evangelho. É o ponto chave dos versículos 11 ao 16. A humanidade pecadora, aqui, pergunta a Deus. É como dissesse: Se foste tu que o levaste de mim, ó Deus, fala-me onde está, que vou buscá-lo. Veja que interessante, a humanidade pecadora não havia reconhecido o Cristo. Estava diante de uma situação real em que Cristo, humanizado, traz dentro de si o que chamamos de divino. Mas quem falava agora era o divino e o humano glorificado, que se mostram à humanidade pecadora. Não se fala em morte. A humanidade pecadora questiona onde está o divino, porque o quer de volta.

"Diz-lhe Jesus: 'Maria'. Voltando-se, ela exclama em hebraico: 'Rabbuni!'" (tratamento mais solene que Rabi e, muitas vezes, usado quando se dirige a Deus). Nesse momento, ao falar apenas Maria, Ele se refere à humanidade pecadora que se opõe a Eva, para que esta acorde e o reconheça. Só então irá entender o grande milagre da encarnação do Verbo.

Este é o momento certo das duas Igrejas. Por isto Jesus falou aos discípulos (Lc 24,49): "Eis que Eu vos enviarei o que meu Pai prometeu (o Espírito Santo). Por isso, permanecei na cidade até serdes revestidos da força do Alto." Havia uma ruptura entre o divino e o humano, apesar do Verbo ter-se encarnado. É por isto que Jesus se enfraquecia em determinados momentos, como quando disse: "Pai, se é possível, afasta de mim este cálice."; "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?" (Mt 26,39; 27,46).

"Disse-lhe Jesus: 'Não me retenhas, pois ainda não subi ao Pai. Vai, porém, a meus irmãos¹ e dize-lhes: Subo a meu Pai e vosso Pai; a meu Deus e vosso Deus.'" Este é o momento em que a humanidade pecadora interage com o divino e o humano glorificado. É como se Ele dissesse: Agora, que você está me entendendo, tem a obrigação de falar a todos. Vá e diga a eles quem Eu sou. E "Maria Madalena foi anunciar aos discípulos: 'Vi o Senhor', e as coisas que Ele lhe disse."

A humanidade pecadora, personificada por Maria Madalena, conta aos discípulos: "Vi o Senhor". Ela é a primeira testemunha da ressurreição de Cristo. Depois, então, Jesus vai aos apóstolos para lhes falar. Era necessária essa participação, esse testemunho da humanidade pecadora, para que Jesus chegasse às duas Igrejas. Nesse momento, Tomé não estava presente, foi quando Jesus instituiu o Sacramento do Perdão. "Soprando sobre eles, disse: 'Recebei o Espírito Santo. Aqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; aqueles aos quais não perdoardes ser-lhes-ão retidos.'" Isto nos sugere que o perdão só se confirma se não houver dúvida.

"Os outros discípulos disseram, então, a Tomé: 'Vimos o Senhor!' Mas ele lhes disse: 'Se eu não vir em Suas mãos o lugar dos cravos e se não puser o meu dedo no lugar dos cravos e minha mão no Seu lado, não acreditarei.'"

Tomé é aquele que, quando da ressurreição de Lázaro (Jo 11,16), disse que, se Jesus voltasse a Betânia, na Judéia, todos os discípulos deveriam voltar para morrer com Ele. Nisto já mostra, por sua racionalidade, a dificuldade em crer, em confiar. Tomé é, como já disse, a personificação da dúvida. Duvidou da presença de Jesus, entre os apóstolos, após a Sua morte, como acreditou que Jesus morreria se voltasse a Betânia.

"Podeis beber o cálice que Eu vou beber e ser batizados com o batismo com que serei batizado? Eles disseram: 'Podemos.' Jesus replicou: 'Do cálice que Eu beber, vós bebereis, e com o batismo com que Eu for batizado, sereis batizados.'" (Mc 10,38-39; Mt 20,22). Mas isto não haveria de ser naquele momento e lugar.

Antes de Sua ascensão (fato ocorrido em Betânia), portanto depois de Sua morte e ressurreição, Jesus deu-lhes as últimas instruções: "Eis que Eu vos enviarei o que meu Pai prometeu (o Espírito Santo). Por isso, permanecei na cidade até serdes revestidos da força do Alto." (Lc 24,49)

Jesus permite que a dúvida de Tomé seja saciada. Na verdade Ele não precisava do testemunho de Tomé, mas, para que as duas Igrejas permanecessem coesas, para que fé e razão pudessem caminhar juntas, a dúvida teria de ser eliminada, pois a integração entre o humano e o divino deveria acontecer, por fazer parte do plano de Deus. Então, aquele diálogo de Jesus com a humanidade pecadora, quando ela não o reconheceu, foi preciso a fim de que Jesus mostrasse à Igreja a necessidade de Sua encarnação. Para que isto acontecesse e se tornasse público, precisava saciar aquela dúvida. Jesus fez isto usando a figura de Tomé, ao atender o seu pedido.

"Oito dias depois, achavam-se os discípulos, de novo, dentro de casa, e Tomé com eles. Jesus veio, estando as portas fechadas, pôs-se no meio deles e disse: 'A paz esteja convosco!' Disse depois a Tomé: 'Põe o teu dedo aqui e vê minhas mãos! Estende a tua mão e põe-na no meu lado e não sejas incrédulo, mas acredita!'"

Jesus permitiu que isto acontecesse para que tenhamos mais fé nas coisas de Deus, para que conheçamos e acreditemos nas verdades reveladas. A dúvida em si não é pecado, principalmente quando se traduz numa busca da verdade.

Desta forma soubemos, também, da integração entre as duas Igrejas. Por isso este Evangelho precisa ser visto dos versículos 11 ao 29, pois é aí que está a sua essência. E o ponto chave é o momento em que a humanidade pecadora diz: "Senhor, se foste tu que o levaste, dize-me onde o puseste e eu o irei buscar!"

A cada vez que lemos o Evangelho, vamos descobrindo verdades e ensinamentos encobertos. Ele contém um "código" interminável, de uma riqueza inesgotável. A beleza do Evangelho é justamente esta: a cada leitura percebemos novos ensinamentos. Este é o maravilhoso poder das palavras de Jesus. Refletindo sobre elas, chegamos a um intrigante quebra-cabeça possível de ser decifrado.

Ao ler o Evangelho devemos procurar as palavras chaves. A ideia principal nem sempre está naquele trecho selecionado para a liturgia do dia. Por isso devemos ler um pouco antes e um pouco depois, para entendermos melhor a mensagem, o ensinamento que contém.

A luz de Jesus nos é transmitida através do Evangelho, que nos ilumina, irradiando sobre nós seus raios de vários matizes. Por isso, antes de iniciarmos sua leitura, devemos pedir ao Espírito Santo que nos ilumine.

 

1 Não se refere aqui a irmãos no sangue, que não possuía, mas àquilo que disse: "Quem é minha mãe e meus irmãos? E, percorrendo com o olhar os que estavam sentados ao Seu redor, continuou: 'Eis a minha mãe e os meus irmãos. Quem fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe.'" (Mc 3,33); ou quando diz: "Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática." (Lc 8,21)

 

Referência: LOPES, Raymundo.Ressurreição III: Jo 20, 11-29. In: LEMBI, Francisco (Org.). O Código Jesus. Belo Horizonte: Magnificat, 2007. p. 219.

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